Definitivamente
já superei a fase de me incomodar com olhares indiscretos. Precisa sem muito “sem-noção”
para eu, ao menos, perceber a insistência visual. Daí para eu me per tubar com
isso, vai uma distância enorme.
Estava
na fila da C&A tentando pagar uma regatinha de academia.
Ah!
Primeiro preciso contar que devido a 1ª cirurgia (mastectomia com esvaziamento
axilar), tenho que fazer regularmente drenagem e, muitas vezes, pelo menos
ultimamente, tenho que usar uma braçadeira (tipo meia kendal, só que não; uso-a
no braço esquerdo) ou um enfaixamento, que fica tipo braço quebrado, para
minimizar o linfedema (braço inchado).
Nesse
dia, do episódio C&A, estava com o braço enfaixado.
O
braço enfaixado chama tanta atenção quanto a touca na cabeça, só que o primeiro
abre espaço para o povo começar um diálogo comigo, o que é 10 vezes pior para mim.
A
lição “Não falar com estranhos” aprendi direitinho em casa, mas parece que esse pessoal por
aí andou faltando essa aula.
Pessoas,
que eu nunca vi mais gordas, perguntam o que aconteceu com o meu braço, que
problema eu tive, se está doendo... Será que elas estão mesmo preocupadas
comigo?
Como
isso já aconteceu váááárias vezes, já tenho uma resposta evasiva e um tanto
antipática: - Nada demais! Tá tudo bem!
Mas
acho que devo aperfeiçoar mais esta resposta e caprichar nos tons cinzentos de antipatia
facial, pois a grande maioria, assim como a caixa da C&A, não se conforma
com o fim de papo e engata uma pergunta mais direta.
A
curiosa atendente logo perguntou na bucha: - Foi queimadura?
Eu
bem que poderia ter dito que sim e encerrar o assunto, mas respondi que não.
Êta reflexo de sincera mais fora de hora...
O
meu “Não” seco, acompanhado de uma expressão acabrunhada, não disposta a fazer
novos amigos, não foi suficiente para me ver livre da fulana. Nem a fila me
ajudava nessa hora, parece que a loja havia sido fechada para me atender.
Olho
para meu relógio a fim de agilizar as coisas. Ela se apressa e logo dispara: - É
câncer? Pergunta com uma cara de quem indaga sobre o clima. Onde foi parar
aquele tempo em que as pessoas tinham medo de pronunciar a palavra fatídica “câncer”.
Essa destemida, com certeza, não viveu nessa época.
Responder
uma pergunta com outra pergunta é a máxima dica que consigo dar para estranhos
de que não estou a fim de interrogatório: - Por quê? Respondo perguntando,
enquanto a encaro e torço para ela se tocar.
Ela
prossegue bem tranquilamente: - Minha tia teve... o seu foi de quê? Ela insiste!
Tento
mudar o foco e permanecer centrada. Uma meditação express, um “contar até 10”,
um “pirlimpimpim” para eu sumir de lá... o jeito é ficar por lá mesmo, afinal
já deveria ter superado isso e não me incomodar tanto em falar do assunto.
Tento
largar as 4 pedras que já estavam nas minhas mãos prontas para ela e, nessa
hora, percebo que ela tem a naturalidade que eu gostaria de possuir nesse
assunto.
Noto que essa é a oportunidade de eu começar a praticar isso. Então,
me desarmo geral.
E
ela continua: - E o cabelo? Já está crescendo?
Com
um semblante tranquilo respondo que ainda não e ela fala com simpatia: - Liga
não boba, vai crescer e ainda mais bonito. Não viu o Gianecchine?
Eu
digo que preferia ele antes dos cachinhos e ela solta uma gargalhada de quem
concorda comigo.
E
não é que essa sem-noção ainda era cheia de bom humor?
Tive
que rir também. Aproveitei e imaginei como eu ficaria com cara de anjinha,
cheia dos cachinhos dourados... hehehe
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